“Trago fado nos sentidos”, concerto para dois pianos
O que se pode esperar de uma homenagem a Amália Rodrigues concebida e protagonizada por Mário Laginha e Bernardo Sassetti? Os dois pianistas e compositores conhecem-se e tocam juntos há mais de uma década, e estão habitualmente conotados com o mundo do jazz. Mas as suas carreiras têm-se construído muito para além dos códigos e sonoridades jazzísticas, incorporando influências clássicas e dos universos da pop, da música popular portuguesa, africana ou latino-americana.
Quando a Casa da Música os desafiou para conceberem uma homenagem a Amália Rodrigues, no décimo aniversário do seu desaparecimento físico, Mário Laginha e Bernardo Sassetti aceitaram com entusiasmo mergulhar a fundo no legado de uma das vozes mais retintamente portuguesas de sempre. Amália não é apenas uma grande intérprete do fado; é, sobretudo, uma alma profundamente portuguesa, no modo como sente e dá voz a uma fórmula musical que espelha intensamente o “sentir português”. Da herança de Amália, os dois pianistas valorizaram sobretudo a que teve como protagonista o compositor e pianista Alain Oulman, responsável por alguns dos mais sublimes temas cantados pela fadista, quase sempre associados a letras de elevada
qualidade literária.
A homenagem a Amália dos dois pianistas tem tudo para ser marcante: em primeiro lugar, a cumplicidade e o perfeito entendimento musical entre os dois músicos, com dezenas de concertos a dois pianos já realizados; depois, uma experiência muito bem conseguida, ocorrida em 2004, de releitura da obra de ou outro grande intérprete e criador da música da música portuguesa, José Afonso, de que resultou a gravação de “Grândolas” e inúmeros concertos memoráveis; e, finalmente, o desafio aliciante de reler e “misturar” alguns grandes fados amalianos com registos aparentemente tão díspares como o jazz e o improviso a ele associado, a que se somam temas compostos pelos dois músicos sob “inspiração” da música de Amália Rodrigues.
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